domingo, 28 de dezembro de 2014

Blinding

Fuckin little world
Até meus ossos balançaram, sacudiram
Com o som de sua voz, naqueles gritos, naquela trilha sonora absurda

Percorreu por todo o meu corpo, naqueles milésimos estendidos, o seu beijo cru
Cada fibra profanava aquela ressurreição insana
E todas elas morreram como todos os momentos

Os meus olhos tombaram, se vestiram de púrpura
Minha boca, flor morta, sufocou em cinzas e terras

terça-feira, 18 de novembro de 2014

Vertical

Deito tudo para o chão
Não, não tudo.
Deito tudo para o chão,
Mas os olhos deixo levantados.

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Antes do café

Despertei amarrotada
Sentindo o seu cheiro a transpassar o sono e me atingindo ali, em cheio.
Confesso que não tive como esconder meu risinho,
Leve e debochado
Bem do jeito que te amarrota, que te transpassa.
Despertei entre travesseiro e lençol
Com o cabelo sem nós. 

quarta-feira, 5 de novembro de 2014

Fazendinha

Ruminei feito uma boa vaca que sou
Produzi um leite morno, que tu vieste colher cedinho
Assim, num banquinho, a espremer minha teta sem carinho

Ruminei feito uma boa vaca que sou
Com as patas atadas, entre estrume e mugidos,
Tu me deixaste sozinha. 

?

Decifra-me ou devora-me.
Devora-me ou decifro-te. 

sábado, 18 de outubro de 2014

Mãos

Vestindo o nu que me destes,
Única forma de me amar,
Percorri bueiros, corri os olhos
Para não te fitar.

Soltando os cabelos que prendestes,
Única forma de me sentir,
Deixei-te pasmo, duro
A me fitar. 

quarta-feira, 15 de outubro de 2014

Noite

Ah, Barthes! Como achei que havia entendido a sua noite.
Ela estava ali, com toda a sua inércia, com todo seu impasse
Com toda a minha passividade.
Achei que vivia a noite em toda a sua completude,
Até me lembrarem que ela não podia ser parte de fragmentos de um discurso amoroso
Pois era puro fragmento
Sem ser mais nada. 

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Olhos a olhar

Olhou-o atentamente,
Com os olhos a secar cada detalhe
Olhando os fios discretos que brotavam na orelha,
Os belos pelos que escapavam pela narina direita.
Deliciou-se ao olhar a boca,
Devorando-a em pedaços generosos.
E quanto mais olhava, mais se prendia,
Maior os olhos ficavam.
Olhou atentamente os poros entupidos que recobriam delicadamente a pele do nariz
Olhou atentamente
Os olhos crescendo
Olhou com olhos grandes
Até que lhe saltou do rosto o olho esquerdo,
Deixando o vazio
Marca de seu amor. 

terça-feira, 7 de outubro de 2014

Condenada

Há tempos espero tua carta.
Meus olhos já tombam sob estas pálpebras pesadas, roxas.
Meus lábios se unem, aflitos, vivendo um Julho eterno.
O negro dos meus cachos toma, por todos os lados, meu rosto de encarcerada.
Permaneço deitada em nosso tálamo de flores e apenas resto. 

domingo, 14 de setembro de 2014

Eu te vejo sumir por ai...

Voltei onde dançamos
Aquele forró junino, no pouco mês que existimos
Ouvi Chico, lembrando das notas que saiam do seu violão, dos acordes
Você estava ali, superando a distância dos anos
Atravessando os desafios do existir.
Voltei onde dançamos
Ouvi meu riso murcho
Sofri uma saudade piegas
Não vi o marrom dos seus olhos.

Calada na cama

Às vezes me invade uma tristeza
Me jogando contra a parede
Para baixo da cama.
Cresce a vontade de quebrar os interditos que nos unem, que nos separam
Mas não vejo tua benção a me espreitar
Então recuo, suspiro calada e calma
Como a noite que segue uma primavera abafada
Perdoa-me por me traíres. 

sexta-feira, 12 de setembro de 2014

Por dentro, por entre, adentro

Não dissecarão meus poemas como o farão com meu corpo
Estará ele vazio, com as tripas, as vísceras na cama
Não encontrarão sinais de amores
Todos se perderam ainda na luta para crescerem, vingarem
Talvez ali, nas veias esturricadas, encontrem vestígios de ilusões
Que se refugiaram em alguns versos igualmente secos.


terça-feira, 9 de setembro de 2014

Amém

Deus me livre de amar tão cedo
Não pretendo erguer templos
Nem derramar palavras
Por nomes passageiros
Desse vácuo do amor prematuro
Prefiro não participar do parto

Cordeiro

Tão frio e tão doce era o seu olhar
A me perfurar.
Acorrentada, minha rubra boca te entregava
Os suspiros, os versos que te fiz
Num só ato, num só sacrifício
Os meus braços abraçavam o mar que nos continha
Nos separava e aproximava,
Num ritmo atormentador.

No meio...

O rosto franziu ligeiramente ao se lembrar de um sonho. Um arrepio percorreu o corpo, assim como uma breve tristeza. Não triste pela recordação, mas pelo pesar de ainda não o ter deixado, de sustentar uma tristeza por alguém que já quase não lembrava, por um amor inventado. 

terça-feira, 2 de setembro de 2014

Mordida

Se tu pudesses me ver
Nessa hora tão tardia, nessa hora em que sua voz entrecorta a minha,
Tão sem empatia, tão afiada quanto a espada que me trespassa o peito
Ao ouvir suas palavras de desprezo
Por tudo o que tenho feito. 

terça-feira, 19 de agosto de 2014

Insônia

Não era solidão
Era ausência de cegueira
Sem conseguir se prender a qualquer palavra
Dita por qualquer boca que se ofereça

Esvaziava mais uma noite
Sem encontrar na cama um sonho reconfortante
Espantava a noite e espantava o dia
Os olhos roxos fechavam com o peso
Das pálpebras assassinadas pelo tédio


segunda-feira, 11 de agosto de 2014

Versos doentios

Fez-me falta, dentre aqueles ombros e aquelas notas,
O seu olhar a me cercar, a dissecar o meu corpo

Lembrei da sua boca na dela e imaginei as das outras
Rezei, céus, pelo seu abraço, Amor
Queria te chamar mais uma vez de Meu. 

Recortes

Meu pulso trazia o cheiro do seu beijo, ainda morno
Arrepiando a minha pele em seu oposto
O seu olhar maroto a me submeter

Sangrava calada, moída
A transbordar uns jorros fétidos

segunda-feira, 4 de agosto de 2014

Palavra silenciada

Nas palavras procuro qualquer desabafo
Mas as palavras não sabem ser confessionários
São metades abortadas
São caminho incompleto
E não dizem nada

Rito

Por vezes uma tristeza acariciava seu rosto, tocava sua pele, fechava seus olhos. Nessas horas puxava o ar, era toda ele e o liberava com o pesar de perder um filho, com o coração parado, a testa franzida.
Repetia o processo, uma espécie de rito ou refúgio doentio. Sofria com intensidade, poupava as lágrimas, mas expandia toda a tristeza para todo o corpo.

quinta-feira, 3 de julho de 2014

Flash

Rodava a cabeça em um movimento mal planejado, mal executado. Um movimento livre e meio doentio. Os cabelos se espalhavam por todos os lados. O corpo acompanhava aquele movimento insano. Os braços subiam desordenadamente, em ângulos brutos e as pernas marcavam aquele ritmo desengonçado. Até que passou e andou.

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Dormência

Por entre os dedos finos escapava aquele pedaço de pano. Um tecido barato, que nos tempos de glória fora azul. As mãos não tentavam recuperá-lo, não se preocupavam em segurá-lo. Ele sentia as pontas dos dedos. O vento o dava forma. Seguia ao lado das pernas esbranquiçadas pelo inverno. Os dedos se abandonavam, paralisados. As bordas do pano se abriam, revelavam os fiapos. A luz do sol o flagrou naquela queda, se demorou nas remendas mal feitas. A linha vermelha ligava frouxamente as metades, os terços, os quartos. O chão empoeirado foi o berço. Ali se estendeu engruvinhado aquele pedaço de pano, sem vontade de se levantar.  

sexta-feira, 27 de junho de 2014

19:47

Doeu quando vi São Paulo pelo quadrado da sala. Simplesmente doeu, sem drama, sem lágrimas. Foi uma dor simples, pura, sem grandezas, que apenas queria ser lembrada.

segunda-feira, 2 de junho de 2014

Parapeito

Sua imagem forçava um espaço em minha cama, me atormentava na insônia, no sono. Atrapalhava com suspiros pretensiosos, rendendo o bom senso, alimentando a amargura. Corria de um lado para o outro da cama, enfrentando o tempo seco que se armava, que se esgueirava pela garganta. 

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Vazios

Queria dizer-te que meus lábios guardam os mais lindos versos que te fiz
Que são eles castos e aguardam por ti
Queria ter as palavrar para compor odes a teu nome
Descrever em tercetos o seu olhar
Mas ele nunca conheci


quinta-feira, 17 de abril de 2014

Soterrado

Novamente via os seus olhos no céu
Que se preparava para devorar a cidade
O ataque, como sempre, vinha de cima,
Com todo o seu peso marrom, marrom terra
A colocar tudo a baixo

Despindo qualquer vestígio de dia
Amargando o azul noturno
Soterrando qualquer suspiro
Seja de amor, seja de saudade


terça-feira, 8 de abril de 2014

Sweet

Pigarreou. O gim barato enroscava na garganta. Ainda estava dolorida. Se arrastou para o banheiro. Não dava tempo para banheira. Mas uma ducha fria bastava. O rímel já estava no fim. Um rosto fino, mal comido, encarava o espelho. Os olhos. Olhos dez anos mais velhos que a vida. Os olhos, mortos, guiavam o corpo já conhecido de muitos. O trago libertou os pensamentos. Suspirou. Não de saudades. Não de amores. De rotina. A amargura desceu com a ajuda do gim. O cabelo secara. Emoldurava o rosto com volume selvagem. Preciso retocar a raiz. Retocou o vermelho da boca para que outros pudessem tirar. Olhou o quarto. Vestiu o roupão de seda. O roupão de seda manchado. O lençol aguenta mais três. Duas batidas na porta. O próximo chegara. Abandonou as cinzas no pé da cama. 

sexta-feira, 21 de março de 2014

Brisa

Tudo o que podia ter sido
E simplesmente não foi
A saudade do seu abraço inexistente, nunca experimentado,
Folha de outono estrangeiro, levada por qualquer vento

sexta-feira, 14 de março de 2014

Maresia

Você quer retomar o posto dos outros
Maré devoradora de todos os castelos
Que ruem com sua mesma frequência

Cegos pelo canto da sereia
Resumem tudo à um rito, ao qual você se rende
Restando apenas a solidão de uma pérola

domingo, 9 de março de 2014

A trava criativa se ativa toda vez que morro, congelo

Me enterro em mim e o ceticismo convém 

Anestesia

O que sentia na hora da revelação não passava nada. A paralisia não permitia o pensar, apenas o respirar. O chão não sumiu como esperava que o fizesse, mas alguma coisa morria. Morria como havia esperado. E o velório não tardava a começar. Mas ninguém reconheceu a viúva, não deram seus sentimentos. Celebravam uma vida alheia.


Não, ninguém vertera uma lágrima, nem ela mesma. Não havia. Fora uma perda que apenas ela reconhecia. Conhecia. A hora da revelação se alastrou até o ponteiro girar e girar e girar. Não sobrava nada, apenas um passado nostálgico que não era o suficiente para morrer ou ser morto. Não encarava o fim, mas uma suspensão. Um desvio na rotina e um sentimento perdido. 

sexta-feira, 7 de março de 2014

Linguagem

Não eram versos de amor
Não pretendiam arrancar suspiros apaixonados
Traziam o calor de fato quente
Com todo o seu mormaço
E consequente desgaste

Que bravam as linhas que os abrigam
Soltos demais para obedecê-las

Dependentes demais para abandoná-las 

quarta-feira, 5 de março de 2014

Dia de faxina

Recordava o meu roxo, amarelo, rosa
Reciclava todo um ciclo
Sorria por mim só
Não me era necessário passarinhos verdes metafóricos

Os concretos já pousavam na varanda

Domínio

Não negue que o ar que você respira
É o que sai de minha boca
Seus olhos já não conhecem o mundo
Ouvem apenas os contos que conto

Sua melodia preferida já é minha voz
Você se rendeu ao que acreditava ser a pureza do amor
Mas não esqueça o que já disse sobre o romance,

Apenas histórias entoadas antes de dormir.

quinta-feira, 20 de fevereiro de 2014

Into de blue

doía pensar a possibilidade, contorcia o corpo e se perdia   premeditava o crime   não havia um plano, era um esboço   a ânsia controlava o rosto, num disforme triste   era uma tristeza de proporções cavalares   não bastava o ato em si, mas o pesar de sua morte   sabia que não cresceria, não ganharia espaço, não ganharia nada   com sorte, talvez desse   daria tanto que esgotaria, sucumbindo em si   o pior era não conseguir executar o aborto   o aborto prematuro já era inviável, já era tarde   pensava e pensava e por mais que tentasse, por mais que quisesse sufocar, não conseguia   o aborto falhara   tudo se expandia, projetando além da barreira da pele   tudo inundava para dentro, sufocava o choro, o desespero   não havia espaço para nada    então esvaziava e permanecia vácuo

quinta-feira, 23 de janeiro de 2014

Reflexo

Virava o copo
A procura do que prometera
Não encontrava a proposta juramentada
Via no espelho aquele infiel olhar
Que quebrava copos, quebrava votos, quebrava o que tocava
Restava estilhaços
Restava
Tão somente restava que já não conhecia mais o verbo

-

É de vermelho terra
Esse céu que me sustenta.

domingo, 19 de janeiro de 2014

Cantiga

Fazia a tabuada dos se te...
Contava com os dedos
Recitava os nomes
E titulava todos como nenhum

Displicência

Não há porque não sorrir
Vem na calma da alma, um tamborzinho aqui dentro
Dispensar, por um momento, os conceitos dos modernos
Reconstruir um sujeito
Despojado de consciência

Talvez

Não esperava tanta relevância em um pequeno gesto, mas a descobri ali, encostada tão silenciosamente. Me surpreendeu sua falta de voz, tão singelo. Mas quando percebi já era tarde, não tinha como voltar. 

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Café

Rabiscava no canto do jornal, tão fugaz. Faltava apenas vestir a camisa, mas era um fardo. Deu um último trago, profundo, buscando sua masculinidade viril. Procurava se desprender daquele sentimentalismo. Não devia ter abrido a carteira de couro marrom. Muito menos descoberto a foto ali enterrada. Um segredo que sempre enterrava ali. Olhou aquele rosto delicado, coçou a barba rala, respirou tão fundo quanto pode. Pegou o isqueiro ao lado do café, acendeu, aproximou a foto. A covardia apagou a chama. Guardou a foto, não suportava o seu olhar. Segurou o cigarro, a masculinidade, último trago. Apagou no café velho.